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domingo, 17 de dezembro de 2017 às 11:20 Postado por Gustavo Jacondino 0 Comments


Quando J. J. Abrams assumiu a franquia Star Wars o seu episódio VII, “O Despertar da Força”, a forte impressão que ficou foi a de um filme hábil, envolvente, dotado de um ótimo elenco e que deixara questões promissoras para uma continuação. Seu ponto mais fraco era a repetição da estrutura narrativa do episódio IV, abraçando a jornada do herói de maneira clássica e repetindo elementos já vistos em outros episódios da franquia, como uma nova Estrela da Morte, a Starkiller, ou o surgimento do novo Império, a Primeira Ordem. Pois em “Star Wars episódio VIII: Os Últimos Jedi” o diretor e roteirista Rian Johnson avança na trama e no desenvolvimento de seus personagens com segurança e uma ousadia necessária para que este episódio não caia no lugar comum de mais um filme da saga, mas que se destaque de tudo que já fora feito antes na franquia.



Os Últimos Jedi” tem início imediatamente após os acontecimentos de “O Despertar da Força”, algo novo na série, uma vez que todos os filmes até então contavam com um espaço de tempo de alguns anos entre si. Narrativamente Rian Johnson reinventa a maneira de narrar Star Wars, mergulhando a câmera em alguns pontos, executando travellings ágeis e inserindo cenas de flashbacks e de cenas curtas com cortes rápidos na narração de alguns personagens. Se J. J. Abrams estruturava seu roteiro no episódio IV, não necessariamente Johnson espelha o seu no episódio V. Apesar de algumas semelhanças, aqui o enredo é mais complexo e intrincado, dividindo a ação em diferentes núcleos narrativos liderados por personagens novos ou que já foram apresentados antes. Estabelecer uma história mais complexa e dinâmica tem como principal custo retardar o ritmo do filme nos primeiros minutos, mas a montagem consegue dar conta das múltiplas histórias que convergem aos poucos no decorrer do longa. Do meio para o fim, o filme atinge um ritmo envolvente e as suas reviravoltas e revelações (que são muitas no decorrer da projeção) deixam possibilidades promissoras para o próximo longa.


 Daisy Ridley está cada vez mais à vontade com a sua Rey, mostrando que conhece todas as fraquezas e conflitos de sua personagem, ao mesmo tempo que consegue estabelecer a sua personagem como a verdadeira protagonista desta nova trilogia, decidida e resoluta, tomando a iniciativa quando é necessário. Mark Hamill entrega aqui a melhor atuação de sua carreira ao compor um Luke Skywalker amargurado e, sim, capaz de errar. Adam Driver reina soberano com seu Kylo Ren, numa atuação brilhante colocando em evidência os conflitos e motivações de seu personagem, rendendo ótimas falas carregadas de emoção. Oscar Isaac tem o tempo necessário para desenvolver o seu Poe Dameron e estabelecê-lo desde já como um dos grandes personagens deste filme, rebelde por definição e com uma coragem e intensidade contagiante, mostrando que ao personagem não falta o espírito de liderança. Laura Dern interpreta Vice Almirante Holdo com a presença e o carisma que lhe é próprio, ao mesmo tempo que sua liderança se faz sentir. O seu desfecho é dos mais catárticos da franquia. Carrie Fisher tem aqui a oportunidade de desenvolver a sua General Leia Organa com mais liberdade e explorando habilidades que nunca antes vimos a sua personagem demostrar em filmes anteriores e é uma pena que a atriz tenha falecido no término das filmagens, pois certamente iria acrescentar muito à mitologia de Star Wars. Dessa forma, é tocante saber que seu legado continua e nunca será perdido, e que esse filme faz parte disso. Finn (John Boyega) e Rose tem uma trama que centra bastante na ação mas que não perde de vista a motivação de seus personagens, com destaque para a Rose de Kelly Marie Tran, que desde o inicio conta com um carisma muito grande em cena. Benicio Del Toro interpreta DJ numa breve aparição e conta com um personagem que explora a maneira como algumas coisas funcionam no universo de Star Wars, algo que soa como uma crítica às grandes corporações e a comercialização de armas, tema atual e que é muito bom ver uma franquia com grande apelo comercial abordar, mesmo que brevemente. O Snoke de Andy Serkis desta vez deixa de ser só um mero holograma e passa a ter a ser uma ameaça mais presente e intensa, exibindo a grandiosidade de seus poderes, mas ainda falta explicações sobre sua origem e seu envolvimento com Ben Solo. O General Hux de Domhnall Gleeson tem mais presença de tela nesse filme e oferece momentos interessantes de interação com os outros personagens, ao mesmo tempo que sai do lugar comum de gritar ordens e passa a expor mais das suas fraquezas. A Capitã Phasma de Gwendoline Christie conta com uma cena que soa apagada perto das demais sequências, estabelecendo a personagem mais como uma figura de apelo visual, tal qual fora Boba Fett na trilogia original. A Maz Kanata de Lupita Nyong’o conta com uma breve aparição, que desempenha sua função narrativa ao passar uma informação para um grupo de personagens, mas nada de muito importante acontece com a sua personagem acontece nesse filme.




Rian Johnson, que já dirigira o ótimo “Looper: Assassinos do Futuro”, além de “A Ponta de um Crime”, “Vigaristas”, e três episódios de “Breaking Bad”, “Fly”, “Fifty-One” e  “Ozymandias”, é um cineasta que dá conta de histórias mais sombrias e pesadas. Quando “Breaking Bad” assume o ponto de virada em sua última temporada, em que Walter White passa a se tornar uma ameaça para a sua família a ponto de ele mesmo comprometer a integridade física das pessoas que deveria proteger em “Ozymandias”, é Ryan Johnson quem narra essa história com precisão. Em Star Wars não é diferente. Apesar do humor presente sempre em cena, seja nas figuras da ilha em que Luke está recluso ou na interação entre os personagens em momentos de tensão, Johnson passa a construir um enredo em que o bem e o mal não são tão facilmente distinguíveis. Personagens bons são capazes de fazer algo mau e os personagens maus podem ter motivações fortes que justifiquem suas atitudes. Aqui Johnson trilha o caminho do meio na linha que separa o preto do branco, valendo-se do que a própria saga já fora capaz de presentar sobre esse tema, tanto em “O Império Contra-Ataca” como e “A Vingança dos Sith”, nesse em particular,  em que a vaidade dos Jedi levaram a destruição da República e o surgimento do Império.





A trilha sonora composta por John Williams tem muito mais personalidade que em “O Despertar da Força”, casando temas clássicos com composições novas sem cair no copia e cola de outros temas já compostos para a série. Aqui há a nostalgia dos acordes do tema da Força, ao mesmo tempo em que a flauta com suavidade no tema da Rey e a grandiosidade das batalhas são narradas por sons fortes. Pode-se ouvir até, em uma cena que se passa num cassino, uma reimaginação da musica tocada na cena da cantina do episódio IV, mas desta vez com acordes da Aquarela do Brasil, expondo toda a criatividade do veterano compositor.



A fotografia inspiradíssima de Steve Yedlin, além das cenas de batalhas que são grandiosas, bem orquestradas e filmadas de maneira envolvente e dinâmica, estabelecendo senso de urgência e fazendo-nos sentir por cada perda ao longo do filme, já servem para estabelecer o filme como o melhor Star Wars em termos visuais. A batalha final é de se admirar com a criatividade e beleza. O CGI, quando empregado funciona muito bem, mas o destaque vai para os efeitos práticos usados no decorrer do longa, dando todo o ar de verossimilhança e realidade às cenas. As lutas de sabre tem mais o caráter narrativo do que de apresentar uma coreografia elaborada. Pessoalmente sempre considerei que um uso funcional do sabre de luz para um enfrentamento deveria ser algo breve, de poucos movimentos e precisão objetiva, algo que passa longe da pirotecnia das grandes lutas que vimos na trilogia prólogo inteiramente dirigida por George Lucas. Nesse sentido, a luta que presenciamos na sala vermelha é grandiosa o bastante e narrativamente representa um momento de virada do filme, que surpreende mais uma vez e revela muito sobre o caráter e as motivações de seus personagens. No enfrentamento que há no final, temos a grandiosidade do personagem de Luke, tratado de maneira respeitosa e evidenciando o poder de um grande e completo Cavaleiro Jedi, numa das sequências mais emocionante da saga.



Apesar de ser sombrio em alguns momentos, a mensagem principal de “Star Wars Episódio VIII: Os Últimos Jedi” é a de esperança. Dessa forma, o filme tem o desfecho perfeito, focando, de maneira quase metalinguística, na imagem que temos dos nossos heróis, e como esses mitos podem nos inspirar a transcender a nossa condição e transformar-nos em donos de nosso próprio destino, assim como uma personagem que, curiosa por descobrir seu passado, vê o próprio reflexo na frente de si.

SPOILERS - LEIA SOMENTE SE JÁ ASSISTIU AO FILME:

Um dos momentos mais aguardados deste filme é a revelação sobre quem são os pais da protagonista Rey. Felizmente a personagem tem a origem mais prosaica possível, miserável até, de pais que não se importavam com ela e simplesmente a venderam em troca de bebida. Isso tira o foco da família Skywalker como a mais poderosa da saga e expande as possibilidades para, como o final confirma, uma nova geração de sensitivos à Força. Inclusive a Força é tratada de maneira muito mais interessante nesse filme, como algo acessível à todos, que poucos podem controlar, sim, mas que pode ser sentido por qualquer um, como a fala de  Maz Kanata no filme anterior confirma. Isso torna o universo de Star Wars maior e mais rico, abrindo espaço para que outras histórias possam ser contadas, nos moldes do ótimo Rogue One.



Direção: Rian Johnson

Roteiro: Rian Johnson

Elenco: Daisy Ridley, Mark Hamill, Carrie Fisher, Adam Driver, John Boyega, Oscar Isaac, Andy Serkis, Domhnall Gleeson, Lupita Nyong'o, Anthony Daniels, Kelly Marie Tran, Gwendoline Christie, Justin Theroux, Veronica Ngo, Warwick Davis, Benicio Del Toro , Laura Dern.

Fotografia: Steve Yedlin

Música: John Williams

Montagem: Bob Ducsay

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