Diretor versátil e dono de uma
carreira prolífica, que englobam os mais variados gêneros, Jonathan
Demme é um diretor que adapta seu talento e sua visão de mundo ao
filme que realiza, e não o contrário. Porém, analisando alguns de
seus filmes mais famosos, podemos notar traços únicos e estratégias
que se repetem no decorrer de sua filmografia. Uma em particular se
sobressai e particularmente me chama a atenção, por consistir na
mesma técnica empregada em diferentes contextos produzindo efeitos
diferentes.
A técnica empregada pelo diretor consiste em filmar os seus personagens olhando diretamente para a câmera, num close-up, um recurso que por vezes beira ao estilo documental em alguns filmes, que por sinal é um dos gêneros que Demme tem contribuído bastante ultimamente.
A técnica empregada pelo diretor consiste em filmar os seus personagens olhando diretamente para a câmera, num close-up, um recurso que por vezes beira ao estilo documental em alguns filmes, que por sinal é um dos gêneros que Demme tem contribuído bastante ultimamente.
Capítulo 1 – Sob o Domínio do mal e
o suspense conspiratório
Comandando a refilmagem de Sob o
Domínio do mal de 1962, de John Frankenheimer, que parodiou o macarthismo no cinema em plena Guerra Fria num enredo que envolvia
lavagem cerebral por parte dos norte-coreanos como por parte dos
anticomunistas do governo americano. A refilmagem de Demme, em época
de eleição e em plena Guerra do Iraque, agora responsabiliza as
grandes corporações nessa grande conspiração que manipula o
candidato à presidente dos Estados Unidos. Ajudando a criar o clima
conspiratório e de suspense, a constante incerteza é invocada pela
trilha e pelos silêncios, e filmar o olhar incerto dos personagens
diretamente, como se participássemos daquela trama, é ao mesmo
tempo eficiente e imersivo.
Título Original: The
Manchurian Candidate, 2004
Direção: Jonathan
Demme
Roteiro: Daniel Pyne
Trilha Sonora: Rachel
Portman
Fotografia: Tak
Fugimoto
Elenco: Denzel
Washington, Meryl Streep, Liev Schreiber, Kimberly Elise, Jon Voight,
Jeffrey Wright, Vera Farmiga
Capítulo 2 – A
Verdade Sobre Charlie e o thriller bem humorado
Comandando mais uma
refilmagem, desta vez de Charada, de Stanley Donen, Demme remete às
comédias que dirigiu mais no início da carreira. Aqui as
provocações e os absurdos típicos da comédia tentam funcionar com
uma narrativa policial que tem um grande segredo guardado no final,
além de uma homenagem ao cinema francês.
Reparem acima a
diferença. Demme quer que participemos da cena, nos sintamos imersos
no que está acontecendo, em vez de sermos meros espectadores.
Título Original: The
Truth About Charlie, 2002
Direção: Jonathan
Demme
Roteiro: Jonathan
Demme, Steve Schmidt
Fotografia: Tak
Fugimoto
Trilha Sonora: Rachel
Portman
Elenco: Mark Wahlberg,
Thandie Newton, Tim Robbins
Capítulo 3 –
Filadélfia e o preconceito colocado em xeque
No excelente
Filadélfia, Demme procura constantemente colocar em evidência o
nosso julgamento em relação ao outro, trazendo uma história que
envolve um grande tabu na época: a AIDS. Comovente e marcante, o
destaque vai para as cenas de tribunal, soberbas. Aqui, quando Demme
enquadra seus personagens olhando para a câmera, é como se eles
falassem conosco, colocando em cheque nossos julgamentos e nos
fazendo pensar sobre eles. O diretor também faz uma introdução
fantástica ao som de "Streets of Philadelphia", de Bruce Springsteen,
filmando pessoas comuns que acenam para a câmera, mostrando o
interesse do cineasta pelo realismo documental.
Título Original:
Philadelphia, 1993
Direção: Jonathan
Demme
Roteiro: Ron Nyswaner
Fotografia: Tak
Fugimoto
Trilha Sonora: Howard
Shore
Elenco: Tom Hanks,
Denzel Washington, Roberta Maxwell, Buzz Kilman
Capítulo 4 – O
Silêncio dos Inocentes e a claustrofobia de uma Obra-prima
Narrando a história de
uma mulher que tenta firmar uma carreira no FBI, Demme retrata o
constante desconforto de Clarice em um meio dominado por homens. Nada
mais natural que ela passe a perseguir um assassino de mulheres. Aqui
a sensação de sufoco e desconforto é evocada pelos closes bem
fechados, mais uma vez contribuindo para a imersão nas cenas e no
próprio entendimento dos personagens. As cenas que envolvem Hannibal
Lecter maravilhosamente tensas.
Título Original: The
Silence of Lambs, 1991
Direção: Jonathan
Demme
Roteiro:Ted Tally,
baseado no livro homônimo de Thomas Harris
Fotografia: Tak
Fugimoto
Trilha Sonora: Howard
Shore
Elenco: Jodie Foster,
Kasi Lemmons, Scoot Glenn, Anthony Hopkins, Ted Levine
Capítulo 5 – O
Dragão Vermelho e a imitação
Brett Ratner,
reconhecendo que estava entrando em terreno já explorado por Demme e
Ridley Scott em filmes anteriores, ao ingressar na série de filmes
de Hannibal Lecter resolve repetir aquilo que dera certo em O
Silêncio dos Inocentes. Dessa forma, o diretor passa a executar
enquadramentos que lembram muito os de Demme nos diálogos entre
personagens. Mas por que o efeito não é tão envolvente desta vez?
Pois não basta fazer os personagens falarem diretamente com a câmera
para envolver o espectador na trama. Essa é só a cereja do bolo de
toda uma construção bem pensada e que ganha sentido quando se tem
personagens fortes o bastante para que possamos nos sentir
envolvidos.
Título Original: Red
Dragon, 2002
Direção: Brett Ratner
Roteiro: Ted Tally,
baseado no livro homônimo de Thomas Harris
Fotografia: Dante
Spinotti
Trilha Sonora: Danny
Elfman
Elenco: Anthony
Hopkins, Edward Norton, Ralph Fiennes, Harvey Keitel, Emily Watson,
Mary-Louise Parker, Philip Seymour Hoffman
Capítulo 6 –
O Casamento de Rachel e o documental na ficção
Em O Casamento de
Rachel Demme resolve voltar à ficção, mas desta vez abraçando uma
estética totalmente diferente. Desta vez ele não precisa inserir
elementos da linguagem documental para que produza a imersão que
deseja no espectador. Desta vez o seu filme será feito todo como se
fosse uma filmagem real de algo que está acontecendo, no melhor
estilo Dogma 95. Sim, é um filme que deve muito à Festa de Família,
de Thomas Vinterberg, mas é uma narrativa que cai como uma luva para
a história da narcisista Kim, que se encontra numa clínica de
reabilitação e vai passar uns dias na casa dos pais para celebrar o
casamento de sua irmã Rachel. Naturalmente somos apresentados a uma
família aparentemente perfeita, até descobrirmos alguns segredos do
passado. E Demme faz belo uso da câmera errante, dos jump cuts e da
música tocada no ambiente. Desta vez ele não recorre ao seu recurso
usual de fazer seus personagens olharem diretamente para uma câmera subjetiva. É
a câmera que deve viajar pelos cômodos, circular entre os
convidados e captar o a natureza das relações naquela família. E
Jonathan Demme faz isso como ninguém.
Título Original:
Rachel Getting Married, 2009
Direção: Jonathan
Demme
Roteiro: Jenny Lumet
Fotografia: Declan
Quinn
Trilha Sonora: Donald
Harrison Jr. e Zafer Tawil
Elenco: Anne Hathaway,
Bill Irwin, Rosemarie De Witt, Mather Zickel
Conclusão:
Muito lembrado pela
Obra-prima O Silêncio dos Inocentes, Jonathan Demme é um cineasta
muito coeso ao longo de sua filmografia, e em seus elencos sempre
vemos nomes recorrentes, como seu mentor Roger Corman, Bill Irwin e
Robyn Hitchcock. Engajado socialmente e de ideologia liberal, não
deixa de tocar em temas complexos, como o preconceito racial. Fã de
New Order, seu bom gosto por música já rendeu boas trilhas sonoras
para seus filmes, e o cineasta usou nos créditos de vários deles a frase em
português “A Luta Continua” com o símbolo da MFA (Movimentos
das Forças Armadas), em memória à Revolução dos Cravos, ocorrida
em Portugal em 25 de Abril de 1974.
Estes foram só alguns
filmes desse grande diretor, que tem documentários, séries de TV
e concertos no currículo. Conhece mais algum filme de Jonathan
Demme que gostaria de recomendar? Deixe nos comentários.
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