Steven Sodenbergh é inegavelmente um cineasta interessantíssimo. Em Traffic isso se torna evidente. Inspirado na série britânica de TV Traffik (1989), Traffic acompanha uma série de histórias paralelas que expõe as diversas facetas do tráfico de drogas.
Passando pela história do policial mexicano, o juiz coordenador da campanha presidencial contra as drogas, a esposa de um bem sucedido homem de negócios que se descobre casada na verdade com um traficante de entorpecentes, os jovens que vivem suas aventuras experimentando as drogas, a dupla de policiais que americanos que combate o tráfico, enfim, as histórias se cruzam de uma maneira a nos fazer perder por algum tempo a noção sobre o que é certo ou errado.
Numa admirável atuação Catherine Zeta-Jones encarna a mãe de família que se descobre envolvida numa teia que nem imaginava fazer parte da sua vida. Quase como um Michael Corleone que se vê puxado para dentro dos negócios da família se obrigando a tomar fortes decisões que vão ecoar por toda a sua vida, a personagem de Zeta-Jones também tem de tomar importantes decisões para salvar a sua família.
Na mesma medida o policial mexicano de Benicio Del Toro, apesar de usar de alguns métodos questionáveis, é um homem que não se corrompe por não querer aquilo que o dinheiro pode comprar: o bem-estar de quem vive naquele mundo onde “os viciados se tratam sozinhos, e os que morrem de overdose são um a menos para nos preocupar”.
Se Del Toro está perfeito, que dizer de Michael Douglas como o juiz que tem que lutar ao mesmo tempo em duas batalhas contra as drogas, aquela travada contra o tráfico e aquela que se vê obrigado a enfrentar dentro de sua própria casa. É interessante notar como a mulher do juiz tende a defender as atitudes da filha com as suas próprias atitudes em tempo de juventude ou com o hábito de tomar Whisky do marido. Ele mesmo reconhece que não sabe ao certo como enfrentar o problema, principalmente o problema dentro da própria família.
E a maneira como os personagens vão se encontrando e se relacionando direta ou indiretamente só reflete que todos estão unidos numa mesma teia onde o certo e o errado se confunde e a vida de uns pode ser destruída por simples atos de outros.
Tecnicamente o filme é envolvente ao investir num clima documental, de câmera inquieta, entre zoom-in e zoom-out, passando por imagens desfocadas (destaque para o desfoque da imagem num plano que envolve a relação sexual entre a menina viciada e o traficante, mostrando que seu vício já vai lhe tirando a própria identidade). Mas além da câmera na mão, Sodenbergh, que também é o fotógrafo do filme, investe numa paleta de cores específica para cada lugar onde se passa sua história. No México temos o predomínio do amarelo na fotografia, além de cenas muito iluminadas, para passar a ideia de aridez e de deserto. Em contrapartida a fotografia mais crua em território norte-americano tem os momentos de predominância do azul, presente no interior das casas e prédios oficiais, geralmente relacionados ao juiz ou à família deste.
Fazendo-nos pensar o tempo inteiro, o roteiro nos entrega um final mais ou menos otimista, mesmo nos fazendo ter a certeza de que não basta somente tirar a droga das ruas, mas também temos que criar condições para se viver sem elas, quem quer que sejam usuários ou “comerciantes”. E é importante ver como o roteiro valoriza a política de reabilitação que é por onde qualquer lugar que quer combater as drogas deve começar. Por fim sabemos o que afinal quer o policial mexicano, algo que com certeza nenhum dinheiro do mundo seria capaz de comprar.
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