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terça-feira, 21 de maio de 2024 às 05:55 Postado por CultComentário 0 Comments


"O Fundo do Coração" conclui com um dos finais felizes mais tristes que eu já assisti. Coppola parece querer pôr em evidência a decadência da sociedade estadunidense, que é bombardeada por promessas de sonhos impossíveis na realidade material da vida. Por isso a constante fuga para um mundo imaginário, uma realidade distorcida em que as canções surgem para narrar as tragédias do sonho americano.

Com uma estética das mais lindas já concebidas no cinema, o longa usa as convenções dos musicais clássicos da mesma forma que Bertolucci fizera em "O Conformista". Ao invés de contar uma história leve (típica dos musicais da Hollywood Clássica) com essas convenções, fundadas a partir de movimentos de câmera disciplinados e luzes que pintam cores primárias nos cenários e constroem composições elaboradas, "O Conformista" opta por colocar dentro dessa forma narrativa uma história brutal e angustiante. E em "O Fundo do Coração", por mais que Coppola se aproxime do tipo de enredo empregado em musicais clássicos, se distancia em tom e abordagem, trazendo essa proximidade com "O Conformista".

Contando uma história de drama romântico bem menos glamourizada que um Douglas Sirk, só para citar um exemplo, "O Fundo do Coração" expõe alguns problemas da sociedade dos EUA. Alienada, angustiada e incapaz de perceber que o motivo da sua tristeza está na maneira imperialista que enxerga o mundo e no seu modo de produção problemático, o núcleo familiar da sociedade estadunidense, que se constrói a duras penas e com muito sofrimento, já nasce fadado ao fracasso.

O diretor de fotografia Vittorio Storaro (em parceria com Ronald Víctor García), o mesmo de "O Conformista", ilumina essa tragédia com um esquema de luzes das mais belas, distorcendo a realidade das personagens para dar conta de um sonho vendido a esses sujeitos, escondendo deles a sujeira da realidade e as contradições do sistema, mais a vista nesse longa do que em qualquer musical clássico, porém disfarçado pela estética que domina o imaginário do cinema escapista.

Fazendo um musical que, provavelmente, pouco agrada a quem está acostumado aos musicais clássicos, ou mesmo aos dramas românticos clássicos, mas também pesando a mão numa estética maneirista que pode surpreender os mais aficionados pelo que sobrou do cinema da Nova Hollywood, Coppola tem o mérito de fazer o filme sustentando a sua visão, de conjugar forma e conteúdo aparentemente contraditórios e paradoxais. E fazer isso, sem dar o braço a torcer por nenhuma concessão que facilite vender o filme, já é um mérito artístico por si só.

Direção: Francis Ford Coppola

Roteiro: Armyan Bernstein, Francis Ford Coppola, Luana Anders

Montagem: Rudi Fehrl Anne Goursaud, Randy Roberts

Fotografia: Vittorio Storarol, Ronald Víctor García

Música: Tom Waits, Crystal Gayle

Elenco: Teri Garr, Frederic Forrest, Raúl Juliá, Nastassja Kinski, Lainie Kazan, Harry Dean Stanton, Allen Garfield, Jeff Hamlin, Italia Coppola, Carmine Coppola, Edward Blackoff, James Dean, Rebecca De Mornay, Javier Grajeda, Cynthia Kania, Monica Scattini, Luana Anders, Judith Burnett, Ty Crowley, Michael David Eilert, Miranda Garrison, Ken Grant, Sandra Gray, Doctor Hayes, Michelle Johnston, Douglas Brian Martin, Lezlie Mogell, James Ridgley, Tom Waits 

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